domingo, 21 de junho de 2009
(por Raphael Souza Novaes) Nasci em 8 de setembro de 1983 e desde então sou são-paulino, por parte de pai, mãe, tios e avós. A primeira era de grandes vitórias pela qual vi meu clube passar ocorreu no início da década de 1990 e se encerrou quando eu tinha pouco mais de dez anos. Tenho na lembrança imagens dos títulos, mas elas se confundem entre as que me marcaram na própria ocasião e aquelas que recolhi ao longo dos anos seguintes, ao rememorar aquelas conquistas. Finalmente em 2004 meu time pôde (que me perdoe a nova gramática) voltar a disputar um tão adorado torneio continental. Eu estive no estádio, quatro vezes. Inclusive naquela em que se iniciou a queda que se concretizaria na sala de casa, através de uma transmissão de tv. Vamos a 2005 então. Belíssimo ano! Levamos o estado, o continente e finalmente e novamente o mundo! Não me atrevi a ver os jogos no estádio, preferi a segurança da simultaneidade entre a imagem televisiva e o áudio do rádio. A delegação voltou a sua cidade de origem. Eu estava lá! Ajudando a entoar o coro que pedia a permanência de jogadores e comissão técnica. Semanas depois, alguns dos jogadores vão embora e troca-se o comandante da equipe. Não fiquei satisfeito. Tive receio de que as mudanças impediriam a nova era de conquistas. Principalmente porque aquela outra, de uma década e pouco atrás, havia tido como expoente máximo a figura do técnico. Chegamos em 2006. O time lidera o campeonato nacional e disputa, a uma só vez, a final do continente. Aqui nessa última o embate é com o vice-líder do nacional. Os dois melhores times do país sem dúvida. Criei coragem e fui assistir ao primeiro jogo. Não acreditei, fiquei estático! Meu time estava caindo diante do adversário que havia sido montado no ano anterior por aquele que agora era o nosso técnico. Desconfiei! De onde estava não vi a cara do homem muitas vezes na beira do campo, como é típico dele, e cheguei a pensar que o cara estivesse dividido. Dividido nada! Eu é que não sabia. Futebol é isso aí, não adianta chorar e “isso aqui é trabalho!” No final daquele ano éramos novamente campeões nacionais e eu passava a valorizar um título do qual não lembrava bem o gosto. O último havia sido um tanto ofuscado na história do clube pelas vitórias internacionais que vieram na seqüência. Agora, com o devido distanciamento, consigo enxergar. Aquele era o verdadeiro início de uma nova era e não o ano de 2005. Depois de novamente termos levado as três cores mais belas do país para todo o mundo, agora era possível se libertar da obsessão há mais de dez anos voltada exclusivamente para os títulos internacionais. Agora era a hora de construir a hegemonia completa, a qual começa pelo domínio dos adversários caseiros. Aqueles com os quais jogamos duas, três, quatro vezes ao ano e não apenas uma vez na vida. A nova era durou três anos e meio. Nesse tempo meu time se sagrou consecutivamente três vezes campeão do país e somou ao todo seis títulos nacionais, apresentou um aproveitamento digno de um soberano e uma capacidade inigualável de superação na adversidade, que sempre ressurgia com o mau desempenho no campeonato continental de início de ano. Dessa vez foi diferente. Agora as más apresentações e a eliminação do campeonato continental colocaram em xeque-mate o nome do comandante. Na noite da última sexta-feira estava na casa da minha garota, a mesma garota que há três anos atrás, em sua outra casa, me recebeu desconsolado ao voltar do jogo em que demos o primeiro passo para a perda do título continental. Daquela vez praguejei furioso, baforando um cigarro atrás do outro da janela de sua sala, contra o técnico que não foi capaz de nos liderar adequadamente. Agora, é engraçado, estava sonolento, sequer pensando na derrota de um dia antes (que nem mesmo na hora me abalou exageradamente) quando a âncora do último jornal da noite disse: “Cai o técnico mais vitorioso dos últimos tempos”. Não tive tempo de pensar. Vinte segundos depois toca o telefone, é minha irmã. Uma das coisas das quais mais me orgulho é ter ajudado a incutir a paixão pelo clube das três cores em minhas duas irmãs mais novas. Ela está p. da vida. Minhas irmãs têm uma visão muito humana do esporte e se apegam às personagens mesmo quando elas não dão resultado. De cara a notícia me incomodou, mas estou aguardando para amanhã a visita de um amigo tricolor, que manja muito mais do futebol propriamente do que eu. Talvez em meio a algumas tantas cervejas a gente consiga chegar a uma solução. Fui dormir. Na manhã seguinte o sujeito aparece na porta com um jornal na mão e falando “o que você acha disso”. Penso, caralho, não gostei, mas esperava que você soubesse me responder e não que fosse me perguntar. Ok, todo mundo sabia que a situação era insustentável e tal. Mas ninguém consegue virar as costas para o que o cara fez nesses últimos anos. Foram cervejas das onze da manhã às sete da noite e nada. Chegamos ao mesmo lugar. No mínimo deviam ter deixado ele lá porque não tem ninguém melhor e por respeito ao que o cara fez e pelo amor dele ao clube. Enfim, o cara é são-paulino. Não se trata um são-paulino desse jeito, porra! Hoje é domingo. A tv mostrou pela manhã o sucessor dele. Um cara que a bem da verdade não fez picas até hoje! Bom, seja bem vindo e boa sorte, mas saiba que você está sucedendo um cara que entrou para a história do clube, um cara que vai dar nome a uma era. E nome próprio aqui somente o dele, Muricy Ramalho.
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