quarta-feira, 16 de julho de 2008

Como toda grande cidade, Frutal também teve o seu clássico. 13 de Maio e Arsenal. Rivalidade histórica, clássico das multidões, jogo sem favorito, etc. Os dois times foram por muito tempo os ícones esportivos, o muro de Berlim que dividia a cidade ao meio. Fatos que não presenciei, mas que não posso deixar de vislumbrar: o Marretão cheio, J. Vasco narrando nas tribunas de imprensa, as descidas dos laterais, os gols incontáveis; Times de fora viajando a Frutal, com um discurso de respeito, a torcida comemorando, as conversas de bar na segunda-feira girando em torno daqueles dois rivais históricos mas, sobretudo, nossos. Só não foi contra o Arsenal o jogo do 13 que tanto me marcou, porque o Arsenal não costumava chegar em finais. Mas sem dúvida, se ainda hoje me declaro trezista - mesmo que o time não exista há tanto tempo - é muito por causa desta rivalidade. Como disse, no entanto, o jogo aqui descrito é outro. O dia em que conheci o Esporte Clube 13 de Maio. No interior do Brasil, oprimidos por um calendário que os deixa ociosos por mais da metade do ano, os clubes pequenos tem duas alternativas: formar times sazonais para disputar meia-temporada, dispensando os jogadores em meados de junho; ou criar campeonatos independentes, geralmente sem o apoio das federações, para tentar se manter da renda dos jogos, revelar algum jogador, ou mesmo chamar a atenção para algum possível patrocínio. Quase nunca dá certo, mas não há muito mais o que fazer. Foi numa dessas ligas, a Copa Minas-São Paulo de 1996, que descobri, tarde demais, o 13 de Maio. Digo "tarde demais" porquê foi justamente no fim dos anos noventa que os times frutalenses, depois de longa agonia, sucumbiram à realidade do futebol moderno, o futebol-empresa, e padeceram. Uma das últimas tentativas de sobreviver, no caso do 13, consistiu na seguinte tática: arrecadou-se uma quantia razoável de dinheiro, sabe-se lá como, e ao invés de investi-la em estrutura, salários e afins, foi aplicada em um nome famoso. Esperança de que no meio de todo aquele amadorismo um profissional salvasse a pátria. Era como pagar por um milagre, e de fato só um milagre salvaria as coisas. Eis então que a grande estrela da Copa Minas-São Paulo de 1996 (ao menos da final)* era a nova contratação do 13. Ninguém menos que Éder Aleixo. Um dos selecionados por Telê Santana na Copa de 82. Aquele gol histórico contra a URSS que nunca saiu de nossas cabeças. Agora, vinte e quatro anos depois, mais para aposentado do que atuante, muitos bicos em times pequenos, mas nenhum dos argumentos negativos ofuscava a estrela trezista para aquele jogo. Partida que seria contra a jovem e competitiva equipe do Pirajuba, o que exigiria do 13 muito suor e correria. Devo justamente ao fato de aquela final ter sido contra o Pirajuba, o motivo de ter conhecido (e torcido) para o 13. Toda minha família do lado materno morava em Pirajuba, e para lá íamos, um fim-de-semana sim, outro não. Como tinha feito menos pontos durante o campeonato, o 13 faria a primeira partida em casa. Justo naquele domingo à tarde eu estava perto do cemitério de Frutal. Não me lembro o que fazia, mas isso não vem ao caso. Na caminhada de volta pra casa vi uma multidão saindo do campo da prefeitura. Perguntei a alguém o que se passava: A final! Quanto? 2 a 1 pro 13. Até então só tinha ouvido falar do time, nunca o vira jogar. Fiquei feliz pelo fato da “cidade” ter ganhado. Nos dias seguintes não pensei mais nisso. No fim de semana seguinte estávamos em Pirajuba. Chegamos sexta ou sábado, e no domingo, perto do almoço, meu tio apareceu e disse: hoje eu e o Fábio vamos à final. Minha ida ao jogo foi imposta, mas sem nenhuma restrição. Lembrei-me imediatamente do jogo da semana passada, e fiquei empolgado. O jogo era às quatro da tarde. Chegamos cedo, umas duas e meia. Vimos chegar o ônibus do 13, por volta das três. Pouco depois chegaram dois animados ônibus com a torcida de Frutal. Torcidas que se misturavam, pelo simples fato de que não havia arquibancadas. A estrutura do estádio (também próximo ao cemitério), era: o campo, o alambrado em volta do gramado, um espaço em volta onde todos ficavam de pé, e o muro, onde muitos ficavam sentados. Como chegamos cedo, pude ficar no alambrado. Nada me fazia soltar daquela grade. Uns vinte minutos antes do jogo começar, chegou uma camionete. Era uma Blazer nova, muito bonita, contrastando com o estado dos ônibus “pau-de-arara” que tinham chegado até o momento. Entrou no estádio e parou ao lado do vestiário. Não entendi nada, até que todos disseram: é o Éder! O primeiro tempo foi um marasmo. Bola pro lado, recuo. Vez ou outra um chute: bola no alambrado. Deu sono, embora pra mim não tenha sido tão mal. Cada lateral batido perto do lugar onde me encontrava, fazia meu coração disparar. Era como se eu estivesse em campo - e na prática, devido à precariedade do estádio, estava mesmo. Começou ruim, mas era uma final. Apesar do campeonato não ser oficial, muito se investiu, os resultados eram cobrados, e no segundo tempo os dois times voltaram diferentes. O Pirajuba precisava do resultado, e se lançou ao ataque. Deu certo. Logo no começo da etapa final, fez 1 a 0. Com esse resultado, o jogo ia aos pênaltis. Foi então que aproximadamente aos quinze, ele entrou no jogo: Éder! Éder entrou, e ele merece um parágrafo novo. Não pelo que fez o jogo todo. Pelo contrário. Com ele o 13 ficou mais lento, o jogo não fluía. A bola parava, voltava. O Pirajuba crescia, quase chegava ao segundo gol, o que faria deles campeões. A torcida adversária hostilizava o craque. Não jogava nada. Mas quando havia uma bola parada, isso mudava. Todos se calavam, apertavam-se contra o alambrado, amigos se entreolhavam, preocupados. A bola passava sempre perto. Os torcedores da casa fechavam os olhos, e respiravam aliviados quando ela saía. Aos 42 do segundo tempo, mais um escanteio para o 13. Seria apenas mais um, mas o batedor era Éder. O jogo estava 1 a 0 para o Pirajuba, o empate era do 13. Escanteio. Éder. Gol olímpico (com a ajuda do zagueiro, pra não ser tão romântico). 3 minutos não eram nada. 13 campeão. Éder aclamado. Comemorei feliz, um pouco afastado de meus tios pirajubenses revoltados - com a arbitragem, diziam que não foi escanteio, com o time, que não fez o segundo quando o jogo parecia fácil. O titulo era nosso. O 13 me dava sua primeira e última alegria. Hoje Frutal não possui mais times profissionais. Quando se fala de 13 e Arsenal é como se falássemos de um tempo tão distante que mal podemos vislumbrar. Às vezes a própria imaginação conta mais que a memória. Dos clássicos, nada ficou, senão histórias quase esquecidas. Alguns esqueletos na cidade ainda trazem os nomes e símbolos dos clubes, mas não passam de nomes. Quem olha pra um muro com um símbolo antigo muitas vezes nem sabe do que se trata. Os que sabem, já nem olham mais. Os que olham, vêem algo esquecido sob a poeira do tempo. Talvez isso se deva à triste certeza de que o futebol mudou, tudo mudou. E aconteça o que acontecer, esse duelo não mais existirá nem mobilizará as multidões, como nos tempos áureos do futebol de Frutal.
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